Corporificando o Texto

Um texto surge a partir de uma frase.
A frase, por sua vez, surge na minha cabeça como uma dúzia de palavras que se auto-combinam ,sem aviso, e de repente ficam apitando lá dentro... Ficam chamando minha atenção para a clara constatação de que tem um texto a caminho.
Algumas raras vezes a frase, é só uma frase. Mas na maior parte dos casos elas se desenvolvem por algumas linhas, tomando corpo e significado.
Existem textos que desde da frase-origem estão fadados a serem somente rascunhos.... Nunca serão publicados, ou ouvidos. Somente eu os sei.
Outros textos, todavia, alcançam o brilhantismo e as vezes são até copiados.
Para escrevê-los não se pode querê-los. Eles chegam até você se for necessário e cabível. Lembro que uma vez eu estava deitado num semi-sono preguiçoso assistindo televisão. Ai de repente veio a frase... Fácil, simples, clara e louca pra virar texto.
A frase era: "Queria falar da efêmeridade da vida"
A partir dela criei "Tic-tac do Eixo Z", um texto que adoro.
Em algumas ocasiões escrevo mais de um texto num só. Isso acontece porque meu pensamento divaga muito longe as vezes e assume vertentes diferentes das primeiras. Mas isso não é ruim. Só é selecionar, copiar, colar e deixar guardado a parte que não se encaixa com o objetivo inicial.
Ali já tenho um texto quase pronto, que irei publicar ou não.
Eu particularmente adoro quando a frase-origem corresponde a uma narrativa. A história começa a se desenvolver inteira na minha cabeça mas raríssimas vezes elas vêm ao papel. O meu problema é que sou incapaz de despender mais do que uma ou duas horas num mesmo texto. Sou incapaz porque textos de diferentes latitudes e cores pipocam dentro mim toda hora querendo ser significados, ser corpóreos. Já tentei algumas vezes escrever um livro mas nunca passo do primeiro capítulo porque surge um capítulo absolutamente diferente que deseja ser escrito. Acabo desistindo de longas narrativas.
Os poemas também vêm em forma de frase-origem. Eu identifico logo que é um poema porque não é só a frase que chega... Todos os versos me acometem de uma vez, nem que seja só os da primeira estrofe. Eles sempre vêm em montes, como se não pudessem existir sozinhos.
Quase nunca rimo. Sou incomum demais para me conformar com rimas e sons previsíveis. Eu não quero que a pessoa que lê os versos consiga adivinhar a palavra que vem a seguir por causa da rima, ou que consiga encontrar padrões nas minhas estrofes.
Por isso que eu não tenho métrica, ritmo ou rimas.
Mas uma coisa é certa... Eu não posso deixar as palavras se auto-combinarem como fazem na frase-origem. As vezes elas se combinam de um jeito convencional demais, ou louco demais e eu preciso reformular tudo. Além é claro do fato que as palavras podem sim formar frases, mas elas só viram texto através da minha forma de organizá-las.
Acreditem, é fundamental ter o controle sobre as enxurradas de palavras que me chegam. Caso contrário elas poderão formar textos dadaístas ou o testemunho de um esquizofrênico.
A única coisa chata é que se você me pedir agora pra escrever um texto sobre o que quer que seja, não serei imediato. Dependendo do humor das palavras elas podem demorar até alguns dias para darem as mãos umas as outras e consituirem sentenças. Mas se eu pedir com jeito, relaxar e meditar sem pressão, elas acabam cedendo e descem daqui de cima até os meus dedos.
É engraçado, que as vezes elas chegam em outro idioma! Aterrisam direto da américa do norte, falando enrolado. Isso é ruim porque eu não sei escrever assim tão bem em inglês, mas as palavras estão lá e se eu não despacha-las, é um problema.
Na verdade, é um problema quando o texto está aqui e eu estou impossibilitado de escrever. Fico como uma represa sustentando mais água do que é capaz. Começo a andar de um lado pra outro, a máquina de escrever na minha cabeça digitando letras e mais letras, os dedos formigam, as unhas são roídas. Depois começa o medo de esquecer tudo e é uma tragédia.
Por isso que tenho sempre um lápis e um pedaço de papel nem que seja para escrever a frase-origem e as palavras-chave.
Ah!
E existem casos em que elas simplesmente se recusam a parar de trabalhar. Continuam descendo, descendo, combinando-se sem parar. Aí eu percebo, meio chateado as vezes, que elas (as palavras) não vão me oferecer nada que constitua um fim.
Nessas horas eu tenho que assumir o controle e ser drástico ao colocar um ponto, do nada e no meio de tudo.
Um ponto, como este.

0 comentários: